
Mais um presente que Romeu Martins que nos traz hoje: uma resenha sobre Sottovoce – A Morte Fala Baixo, uma “Graphic Novel porto-alegrense”, desenhada por Edgar Vasquez e editada pela LPM. É só ler e curtir
As tiras de jornais são uma das mais fascinantes e populares modalidades dos quadrinhos que já existiram.Enquanto a tiragem de uma revista em quadrinhos do Batman ou do Homem-Aranha pode chegar na casa das dezenas ou até centenas de milhares de edições em casos muito bem sucedidos, uma tirinha distribuída por um syndicate (como são chamadas as agências de distribuição dos Estados Unidos, como a King Features Syndicate, por exemplo), podiam facilmente alcançar aos muito milhões de leitores em seu auge. Só pensar em algumas das agenciadas pela já citada KFS, como Recruta Zero ou Hagar, ou de sua concorrente Universal Press Syndicate, como Garfield ou Calvin e Haroldo.
O Brasil também tem sua tradição na área. Talvez o exemplo mais conhecido seja o de autores da chamada Geração Circo, Angeli, Glauco e Laerte, que produziam para a Folha de S. Paulo as tiras Chiclete com Banana, Geraldão e Piratas do Tietê (esta última ainda em circulação).
Agora, existe algo em comum com todos os exemplos mencionados até agora: são todas produções de humor. Mas não é uma exigência, tanto que os americanos se consagraram criando tiras de aventura e policiais, tais como Flash Gordon e Dick Tracy. No Brasil é que existe menos variedade temática, sendo difícil apontar algum exemplo que não seja humorístico.
E é aí que entra o diferencial da publicação que vamos comentar hoje: Sottovoce – A Morte Fala Baixo. Apesar de seu autor, o cartunista Edgar Vasques, classificá-la como uma “graphic novel porto-alegrense”, as origens do material não mentem.

Entre julho e setembro de 1997, o caderno regional publicado no Rio Grande do Sul do jornal de economia Gazeta Mercantil começou essa rara experiência que foi uma rara incursão em tiras policiais feita no Brasil. Em sessenta capítulos, os leitores do periódico puderam acompanhar a história de um jornalista que investiga uma série de atentados.
O responsável pela morte de um antigo senador biônico gaúcho que agiu durante o regime militar teria sido um mascarado que se inspirava em uma lenda urbana ligada ao carnaval de Veneza.
Um possível terrorista que protege sua identidade com uma máscara e atitudes teatrais, agindo por motivações tanto políticas quanto pessoais? Por essa lista, é fácil ligar Sottovoce à V de Vingança, obra dos ingleses Alan Moore e David Lloyd. Porém quem ler o material pode também encontrar semelhanças com um mangá que por coincidência era publicado exatamente na mesma época, Oldboy, dos japoneses Garon Tsuchya e Nobuaki Minegishi.
O que faltou ao quadrinho nacional foi a oportunidade que tanto a HQ inglesa quanto a japonesa tiveram de chegar aos cinemas (Oldboy por duas vezes, primeiro em um filme coreano depois por outro americano). Qualidade tanto no roteiro quanto na arte, Sottovoce tem de sobra para conquistar o público do audiovisual.
As tiras foram compiladas um ano depois do encerramento da publicação no jornal, pela editora L&PM em um álbum de proporções horizontais de alta qualidade. Na época, Edgar Vasques já era consagrado por outros materiais como a tira tragicômica Rango e pela quadrinização do Analista de Bagé feita em parceria com seu conterrâneo Luis Fernando Veríssimo.

Rango de Edgar Vasquez
Sottovoce – A Morte Fala Baixo foi sua experiência dispensando o humor para contar um thriller político com elementos de investigação policial. Merece ser relembrado e celebrado, pois mais do que uma raridade entre a produção de tiras brasileiras, é um verdadeiro marco que merece ser redescoberto por novas gerações de leitores.